Retratos Fantasmas (2023) - dir. Kleber Mendonça Filho

 

O diretor brasileiro Kleber Mendonça Filho realiza em seu longa-metragem Retratos Fantasmas uma ode ao fazer cinematográfico e à sua carreira, utilizando localidades de Recife como seu objeto de estudo. A trajetória do autor frente às telas aparece retratada de forma intrínseca com o tema proposto, fato que auxilia a promoção de uma trama singular ao incorporar sobressalências no filme verídicas à sua vida. Com isso, a produção cinematográfica de forma crua e simples se apresenta de maneira desnuda como parte fundamental da característica do longa e da intenção do diretor, que mescla arte e cotidiano em uma dança comovente plausível de devoção do espectador à trama. Tal ideia abarca sensibilidades diferentes narradas oralmente por Kleber Mendonça Filho que se posicionam como um sólido acerto no quesito da conexão criada entre a realidade do autor exposta e o público.

Semelhante aos relatos, outra apreciação entusiasmada são as localidades apresentadas e as histórias presenteadas ao público, que desempenham papel fulcral no entendimento da realidade recifense e do cinema, explorando um vasto campo de estudos e de relações que o diretor trilha de maneira aprazível. O urbano aqui exposto renega sua condição como cenário e participa ativamente da compreensão do real, algo que mostra de forma curiosa a cidade como agente da transformação da vida dos indivíduos, e não o contrário.

Dessa forma, além de ser possível encontrar beleza e inspiração no cotidiano, o longa-metragem ainda nos agracia com referências históricas e sociais capazes de enriquecer o conteúdo difundido, além de tocar em outras áreas da arte como arquitetura e fotografia. Esta, funciona como emolduração e perpetuação do tempo, enquanto aquela transforma-se na apreensão das realidades existentes. Indo além, esta tangencia as mudanças existentes na sociedade e na cidade, ao passo que aquela ajuda na compreensão histórica.

A seleção oficial do longa-metragem ao Oscar pelo Brasil pode-se entender pelo fato de a Academia se interessar por filmes que abordam o fazer da arte e tramas que envolvam artistas, seja ela qual for. Exemplos recentes como Nasce uma estrela (2018), Era uma vez em… Hollywood (2019) e Maestro (2023) clarificam esse fato, pois todos estes citados concorreram à estatueta de Melhor Filme nos anos seguintes a que foram lançados.

Em suma, o trabalho apresentado por Kleber Mendonça Filho se comporta como uma reverência ao cinema, tanto no âmbito nacional quanto internacional, demonstrando amor por essa arte e cativando o público a fazer o mesmo.

Marlon Ramos

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O Documentário Retratos Fantasmas de Kleber Mendonça, nos mostra filmes antigos e imagens e depoimentos montados em uma narrativa nostálgica, nos remetendo a um passado distante, Mostrando as transformações urbanas e sociais da cidade de Recife através dos cinemas que faziam parte do cotidiano da cidade e com o passar do tempo foram fechados para dar espaço a outros empreendimentos como lojas, ou mesmo estruturas completamente abandonadas.

  Passando pelo passado e presente, vemos uma cidade antes pulsante, mas agora apagada e cinza, com alguns resquícios de um passado, mostrados através dos cinemas agora abandonados e sem vida, como mostrado no cinema São Luiz, ou o próprio cinema Veneza que ficou irreconhecível.

  O Documentário evidência acima de tudo de que o tempo continua passando e certos locais são substituídos por outras funções ou até mesmo sendo demolidos, Vale ressaltar que os cinemas de rua foram quase todos fechados com o passar do tempo, E a grande maioria dos cinemas foram se instalando em Shoppings Centers, entretanto com o advento dos Streamings os próprios Cinemas atuais já correm o risco de serem substituídos pelo conforto de se poder assistir filmes em casa. Nos mostrando que o progresso e o tempo continuam passando e certos locais são substituídos por outros, ficando apenas as memórias e a sensação de nostalgia do que um dia foi tal lugar.


Rafael Perkovski Müller

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Ao longo das 3 partes que apresentam como temas diferentes aspectos da vida no Recife, o diretor Kleber Mendonça Filho escreve em Retratos Fantasmas uma carta de amor não só para a cidade, mas também para as pessoas que vivem nela e que são seu coração, sua força vital. Unindo sua história de vida e sua trajetória profissional à da cidade, o diretor convida o público a pensar sobre a relação que desenvolvemos com os lugares nos quais vivemos: como uma rua, um apartamento, uma igreja, um cinema e as pessoas que vivem neles podem nos marcar profundamente e continuar vivendo através de nós mesmo muito depois de terem deixado de existir.

Partindo do uso de diferentes fontes de imagens e vídeos, desde seu acervo pessoal até anúncios de jornais, o filme passa a impressão de uma colcha de retalhos costurada por Mendonça, com um tom muitas vezes melancólico, com o objetivo de capturar e exaltar a memória de um Recife que não existe mais. Seja porque alguns dos cinemas citados pelo diretor fecharam as portas e foram substituídos, seja porque a relação do público com as salas de cinema em si mudou (e continua mudando, por exemplo, com o advento dos streamings e com o fato de que a grande maioria dos cinemas hoje se encontra dentro de shoppings), a cidade na qual o diretor cresceu e desenvolveu seu amor pelo cinema vive hoje apenas em sua memória e em seus filmes.

Mesmo sendo uma obra bastante íntima, o diretor consegue utilizar do plano pessoal para trazer à tona também o universal. Os fantasmas de Kleber Mendonça Filho remetem aos nossos próprios fantasmas, aos lugares e memórias que vivem em nosso coração e que carregamos conosco, aos filmes que assistimos ao longo da vida e dos quais nos lembramos até hoje. É uma obra que dialoga com o que temos de mais íntimo, ao mesmo tempo que nos lembra do todo do qual somos todos partes essenciais. A construção do Recife e de sua história é entrepassada pela construção da realidade do diretor, pelos cinemas, igrejas e todos os outros lugares que ele frequentou, e, essencialmente, por seu sentimento de profundo amor pela cidade que ele demonstra no filme.

Em um mundo no qual o acesso à cultura e aos espaços culturais se torna cada vez mais elitizado, Retratos Fantasmas nos lembra da beleza intrínseca desses espaços, da importância de sua democratização e de como eles são cruciais para o desenvolvimento da maneira como vemos, interagimos e construímos o mundo à nossa volta. A viagem agridoce pela cidade natal do diretor a qual somos muito bem conduzidos pelo filme destaca, enfim, a essencialidade do caráter historiográfico dos filmes: o tempo passa, as salas de cinema fecham, mas os registros das câmeras ficam. 


Graziela Alves

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Com Retratos Fantasmas, Kleber Mendonça Filho abandona momentaneamente a ficção, mas não perde a intensidade narrativa que o consagrou. O documentário mergulha no centro do Recife, rastreando a vida dos antigos cinemas de rua e, com eles, a memória coletiva de uma cidade que mudou – e continua mudando.
O filme parte de um ponto de vista pessoal, mas nunca se fecha no individual. As lembranças do diretor se misturam às imagens de arquivo e a registros caseiros, criando um mosaico afetivo que é também um diagnóstico social. Entre as paredes que já vibraram com sessões lotadas, vemos hoje estacionamentos e igrejas; onde antes havia experiência coletiva, instala-se a solidão das telas domésticas. A transformação urbana surge como um fantasma, silencioso e inevitável.
A escolha estética é primorosa. Kleber articula a montagem com ritmo contemplativo, mas não monótono: o espectador é guiado por fotos, vídeos, cartazes e sons que evocam não apenas um passado, mas um modo de viver o cinema que parecia eterno. A narração, pessoal e melancólica, dá unidade ao relato sem soar autoindulgente. É um lamento e, ao mesmo tempo, uma celebração daquilo que o tempo levou, mas a memória insiste em preservar.
Retratos Fantasmas é, portanto, uma reflexão sobre pertencimento, identidade e sobre como as cidades devoram a si mesmas em nome do progresso. Com delicadeza e rigor, Kleber transforma o Recife em espelho do mundo, lembrando-nos de que toda paisagem urbana é feita de presenças e ausências. No fim, resta a sensação de que, entre tantas ruínas e vazios, o cinema ainda é um lugar possível para habitar – mesmo que apenas na lembrança.

Elisa de Melo Schlichting
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Com um tom melancólico e um off com a voz compassada do próprio Kleber Mendonça Filho, Retratos Fantasmas usa imagens de arquivo pessoal, planos de outras obras e registros atuais para construir uma narrativa que funciona quase como uma máquina do tempo. Você observa o cenário urbano de uma cidade que nunca pisou, vê as reformas de um apartamento que não é seu e o interior de prédios que hoje não existem. No fim, é tomado pela nostalgia de algo que nem viveu.


Primeiro, te é mostrado como a moradia do diretor se transformou em cenário para seus filmes e como as mudanças progressivas da comunidade ficaram marcadas em suas obras: o portão que não existia antes, os cupins da casa ao lado, o latido do cachorro que ficava sozinho. Tudo que acontece ao seu redor é importante de alguma forma, mesmo que passe despercebido à primeira vista.


É então que você mergulha no centro de Recife; as ruas, os cines, os letreiros, as pessoas. Aqui, você entende como o cinema sobrevive no decorrer da história, como o espírito indomável do povo não permite que a arte definhe ou perca sentido em tempos sombrios, de ódio e censura. Ele se transmuta, adapta-se conforme o contexto político, econômico e social, mas não deixa de existir. A igreja vira sala de cinema, que vira igreja de novo. Quem garante que a mudança não acontecerá mais uma vez?


A obra é uma carta de amor, não só ao Recife, mas também ao cinema. Acima de tudo, é uma reverência aos fantasmas que de alguma forma colaboraram com todas as histórias já contadas pelo diretor. São todos aqueles, sejam de carne ou de concreto, que estão fora dos retratos, mas presentes. 


Camilly Iagnecz
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"Às vezes, o passado sussurra mais alto que o presente."

"Retratos Fantasmas" não é apenas um filme; é um mergulho nas camadas invisíveis da cidade e de quem a habita. Cada cena traz o peso da memória e a delicadeza de um afeto que insiste em permanecer. É como caminhar por ruas conhecidas e sentir que algo ou alguém ainda vive ali, mesmo quando tudo parece esquecido. Há beleza no que resta e uma melancolia suave no que já se foi.  

A fotografia parece tocar a pele dos espaços, revelando fissuras, silêncios e histórias não contadas. A trilha sonora, quase etérea, cria um elo íntimo entre quem assiste e o que se perdeu, ou ainda resiste.

Mais do que observar prédios antigos ou salas vazias, somos convidados a sentir a presença de vidas que continuam ali, pairando como ecos emocionais. É cinema que olha para trás, mas fala sobre o agora, sobre tudo o que tentamos guardar antes que o tempo leve embora.


Kailani Novello

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Retratos Fantasmas é um documentário dirigido por Kleber Mendonça Filho e lançado em 2023, que mergulha na memória afetiva e urbana do centro de Recife. O filme percorre décadas de mudanças sociais, urbanas e culturais. É um ensaio pessoal que, ao revisitar espaços e histórias, se torna também um retrato universal sobre memória e desaparecimento. Assistir a Retratos Fantasmas é como folhear um álbum de fotografias que é íntimo e coletivo ao mesmo tempo, mesmo quem não tem ligação direta com a cidade consegue se identificar com a experiência de ver espaços que moldaram vidas desaparecendo ou se transformando. O documentário emociona pela delicadeza, mas também provoca reflexão sobre como tratamos nossas cidades e memórias. Ele é um documentário poético necessário, que une o pessoal e o universal, o íntimo e o político. Kleber Mendonça Filho reafirma sua potência como contador de histórias, desta vez não pela ficção, mas pela memória. É uma obra que emociona, faz pensar e amplia nossa compreensão sobre a importância de lembrar.

Brenda Alves

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Retratos Fantasmas é um filme que impressiona mais pela atmosfera que cria do que pela narrativa em si. A proposta de Kleber Mendonça Filho é mergulhar em suas próprias lembranças e, a partir delas, refletir sobre a cidade do Recife e suas transformações. Isso torna a obra muito pessoal, quase íntima, e é justamente esse aspecto que gera sensações contraditórias: em alguns momentos, a experiência é envolvente e carregada de emoção; em outros, parece excessivamente centrada no diretor, criando certa distância do espectador.

O que mais me chamou atenção foi quando o filme fala dos antigos cinemas de rua. Nessas horas, ele deixa de ser só sobre as lembranças do diretor e passa a tocar em algo maior, que qualquer pessoa pode sentir: a perda de lugares que marcaram a vida de muitas pessoas. Essa parte tem impacto e ressoa de forma universal, despertando tanto nostalgia quanto indignação diante do descaso com a memória urbana.

Um ponto que me incomodou foi a falta de cuidado com a linguagem visual. Apesar de ser um documentário, eu esperava encontrar mais ângulos e enquadramentos que dessem expressão e personalidade às imagens. Em vários momentos, a câmera parece registrar de forma muito simples, quase amadora, Esse tipo de simplicidade funciona bem nas cenas em que fica claro que esta é a intenção do autor, mas em outras - como quando o diretor mostra a fotografia de um suposto fantasma ou entidade - o resultado soa desajeitado, sem intencionalidade clara. A impressão que passa é de um enquadramento fora de contexto, o que enfraquece a proposta e também tira parte da força poética da cena.

Além disso, o ritmo lento e a insistência em detalhes muito pessoais acabam prejudicando o conjunto. Há momentos em que a narrativa se arrasta e repete ideias que já estavam claras, o que dá a impressão de que faltou uma edição mais rigorosa. Essa escolha estética pode ser vista como coerente com o tom contemplativo do filme, mas também pode cansar quem espera uma obra mais direta ou dinâmica.

Ainda assim, Retratos Fantasmas não deixa de ser um trabalho relevante. É uma espécie de ensaio visual que mistura memória, política e cultura, com um olhar melancólico, mas também crítico. Talvez não conquiste todos os públicos, mas certamente provoca reflexão sobre o valor dos espaços culturais e sobre como nossas cidades carregam fantasmas de um passado que insiste em desaparecer.

Eduardo Favacho De Queiroz Filho
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Retratos Fantasmas (2023), dirigido por Kleber Mendonça Filho, é um documentário que se constrói como um espectro afetivo sobre o Recife e suas transformações. O filme trabalha a partir de registros íntimos, caseiros, da própria vida do diretor, para expandir-se em memória coletiva, criando uma linha narrativa que é ao mesmo tempo pessoal e política.

A montagem, feita de fragmentos que se repetem e se desdobram, traz esse olhar de permanência e perda, como se as imagens insistissem em existir mesmo quando a cidade insiste em apagá-las. De início nostálgico, o tom vai ganhando força crítica, pois o que poderia ser apenas um álbum de lembranças se revela também um retrato da exclusão, da especulação imobiliária e da desigualdade social que moldam o espaço urbano.

Kleber Mendonça nos guia por uma Recife que já não existe mais, porém que permanece viva no cinema. E é nesse choque entre lembrança e ausência que o documentário encontra seu peso: ao mesmo tempo que emociona pela nostalgia da memória, denuncia as violências de um sistema que consome até mesmo a própria identidade cultural da cidade. Retratos Fantasmas é, assim, um filme difícil de não se impactar, também é necessário ser visto pela sua capacidade de transformar o íntimo em universal.

Samuel Torres

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