E la nave va (1983), Federico Fellini

 Resenha Crítica E La Nave Va 

Por Ana Luísa Antonioli 

E la Nave Va, dirigido por Federico Fellini e lançado em 1983, é um filme que mistura drama, comédia e fantasia, apresentando uma narrativa singular e poética. O filme é uma homenagem a uma famosa cantora de ópera falecida e retrata a jornada marítima de amigos e colegas que transportam seu corpo para que seja sepultado no mar. Com seu estilo inconfundível, Fellini tece uma história que aborda temas como a arte, a memória e a decadência social. 

A meu ver, esta é uma obra que exibe a maestria visual e narrativa de Fellini. O filme é um prato cheio em todos os sentidos, já que o diretor tem uma atenção meticulosa aos detalhes visuais. Fellini cria um mundo surreal a bordo do navio, repleto de personagens excêntricos e situações absurdas que são ao mesmo tempo cômicas e melancólicas. 

A escolha de Fellini de utilizar cenários artificiais e efeitos especiais estilizados adiciona uma camada de teatralidade ao filme. Além disso, a trilha sonora complementa perfeitamente a atmosfera, misturando peças de ópera com outros estilos que evocam uma sensação de nostalgia e introspecção. 

Ademais, a teatralidade pode ser vista também nas atuações. Os atores se movimentam e interpretam tudo com certo exagero. Assim, cada personagem a bordo do navio é uma caricatura que representa diferentes aspectos da sociedade e da condição humana, desde a aristocracia decadente até os artistas e trabalhadores comuns. 

Lançado em 1983, ele reflete a desilusão de Fellini com a sociedade contemporânea e sua nostalgia por uma era passada, mais inocente e artística. A produção do filme foi marcada pela criatividade característica do diretor, mas sempre com referências a obras de ópera e cinema clássico. Em entrevista, o próprio Fellini afirmou que o filme era uma homenagem à grande tradição operística italiana. 

De modo geral, o filme foi bem recebido por críticos e espectadores, que elogiaram a obra-prima de Fellini. Apesar disso, algumas críticas relataram a dificuldade em se conectar com o estilo do diretor. No Rotten Tomatoes, o filme possui uma taxa de aprovação que reflete essa divisão, com uma recepção crítica

geralmente positiva. No IMDb, o filme mantém uma boa classificação, sugerindo uma apreciação contínua por parte do público ao longo dos anos. No geral, os espectadores frequentemente destacam a beleza visual do filme e a habilidade de Fellini em criar um mundo único e imersivo. A combinação de comédia e melancolia, característica de muitos dos trabalhos de Fellini, é especialmente marcante em E la Nave Va, proporcionando uma experiência cinematográfica rica e multifacetada. 

Referências 

Rotten Tomatoes. E la Nave Va. Disponível em: 

https://www.rottentomatoes.com/m/e_la_nave_va 

IMDb. E la Nave Va. Disponível em: https://www.imdb.com/title/tt0087188/ Entrevista com Federico Fellini. Sight & Sound. Disponível em: 

https://www2.bfi.org.uk/news-opinion/sight-sound-magazine/interviews/federico-fellini -e-la-nave-va 

Comentários de críticos na Variety e no The New York Times sobre E la Nave Va.

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Enquanto o navio vai, a vida continua na mesma?
por Giovanna Goin

Riqueza extrema e drama humano são o match perfeito nesta crítica atemporal de Federico Fellici. A produção italiana "E la nave va", de 1983, nos leva a bordo de um navio de luxo antes da Primeira Guerra Mundial. Na verdade, a embarcação serve de palco para retratar a Europa e todas as atrocidades daquela época. Escancara de maneira cômica e musical os desequilíbrios de classes socioeconômicas e complexidades humanas, que ultrapassam gerações e épocas. 

A história gira em torno de um grupo de artistas que está de luto pela morte de uma famosa cantora de ópera, Edmea Tetua. Amigos e familiares alugam um navio para cumprir o último desejo da falecida: ter suas cinzas jogadas no mar, perto da ilha natal. Dentro da embarcação, encontramos cantores, atores, músicos, um Grão-Duque e até um rinoceronte. Também está lá Orlando, um jornalista que narra a história para a gente, falando diretamente com a câmera e quebrando a quarta parede para nos fazer rir, chorar e refletir.

Uma das melhores cenas do filme mostra os cantores de ópera competindo quem tem os melhores vocais na sala das máquinas do navio. Para os trabalhadores explorados e mal pagos, é um raro momento em que recebem uma performance da alta cultura “dedicada” a eles. Entre aspas mesmo. Porque ali, não existia um sentimento de empatia ou generosidade. Apenas uma grande disputa de ego e a necessidade do espetáculo para massagear o mesmo.

Outro momento em que a discrepância de classes fica escancarada é quando um grupo de sérvios, fugindo da guerra, é resgatado no mar. Eles sobrevivem na parte descoberta do navio e observam os passageiros ricos comendo, rindo e dançando com leveza através das janelas. Esse olhar, talvez de ódio, inveja ou admiração, destaca a enorme diferença entre a riqueza dos passageiros e a miséria dos refugiados. Te parece familiar? 

O filme também traz uma reflexão interessante quando o jornalista Orlando percebe que "tudo já foi dito e feito" após ler as anotações em seu diário. Isso nos faz pensar sobre a originalidade na arte e na vida. Será que uma comédia romântica deixa de ser boa por ser clichê? Nossa reflexão pessoal perde valor por ser algo que todos experimentam em algum momento, como a crise dos 20 anos?

Para mim, Fellini nos entrega uma obra divertida e profunda, mostrando que o óbvio precisa ser dito e filmado e que, às vezes, ele ainda não é óbvio para todo mundo. De maneira divertida, ácida e com belos vocais dos atores envolvidos, entendo que o longa tenta nos mostrar que nossos problemas ainda são os mesmos e que não podemos viver como os nossos pais. Nesse caso, tataravós. 


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